por paulo eneas
A grande “vitória” da direita nestes quase três anos de Governo Bolsonaro foi mostrar ao público brasileiro e até mesmo ao mundo o quanto ela é capaz de mobilizar apoiadores do governo para grandes manifestações de rua, deixando a esquerda para trás neste quesito.
Isso é um fato inegável: nestes quase três anos, dezenas de manifestações em todas as cidades do país levaram milhões de pessoas às ruas, em atos pacíficos e democráticos com volume de adesão espontânea da população sem precedentes na história nacional.
A força destas mobilizações é de tal ordem que inúmeros influencers e mesmo políticos de direita se regozijam, em contraste, diante dos constantes fracassos e fiascos das manifestações da esquerda, que não atraem público e são invariavelmente esvaziadas e terminam quase sempre em atos de violência entre seus próprios manifestantes.
Mas esta “vitória nas ruas” pode ser apenas uma Vitória de Pirro. Pois também nestes quase três anos a direita não avançou um milímetro sequer na conquista de posições nas esferas reais de exercício de poder, esferas estas que não estão nas ruas, mas nas instituições de Estado e nos aparelhos de produção de cultura e de informação.
Em quase três anos, a direita não avançou em nada em sua já quase inexistente presença no meio acadêmico. Não surgiu nenhum veículo de comunicação e jornalismo de viés de direita capaz de fazer frente, em termos quantitativos de audiência e alcance de público, à hegemonia que continua sendo exercida pela velha mídia mainstream que segue a cartilha da esquerda globalista.
A audiência somada de todos os veículos da direita, portais e canais de vídeo que existem somente na internet e estão sempre sujeitos à censura, não consegue nem mesmo arranhar a hegemonia avassaladora de um programa de televisão de domingo como o Fantástico ou a audiência noturna diária do Jornal Nacional da Rede Globo.
Enquanto a direita lota a Avenida Paulista em manifestações de verde e amarelo que fazem encher os olhos, a esquerda conseguiu assassinar mais um pouco o idioma pátrio, impondo a chamada linguagem neutra de gênero em órgãos públicos e até mesmo em escolas. E para arrematar, a próxima novela global adotará esta violação da linguagem que em breve estará presente todas as noites em dezenas de milhões de lares brasileiros.
A direita nestes três anos não conseguiu formar um partido político. Ela foi derrotada nas últimas eleições municipais, apesar desta derrota ter sido inacreditavelmente interpretada como vitória pelo fato de o grande vencedor das eleições ter sido o establishment político circunstancialmente aliado ao governo.
A direita não foi capaz neste período de criar nenhum think tank de expressão digno do nome, e a pouca produção intelectual de altíssima qualidade criada neste período por alguns poucos pensadores conservadores foi e continua sendo solenemente ignorada em favor da lacração nas redes sociais. E em favor das manifestações, claro.
Soma-se a tudo isto o cenário de restrições da liberdade de expressão e dos direitos civis que atingiram em cheio a direita no ambiente criado por um tensionamento institucional cujo desfecho tem sido claramente em desfavor da própria direita.
Diante deste conjunto de derrotas e retrocessos, o sucesso da direita nas manifestações de rua constitui-se nada mais do que uma Vitória de Pirro. Uma vitória pírrica com a qual a direita parece contentar-se e que usa como poeira mágica lançada nos próprios olhos para ocultar todas as suas derrotas.
Nota de História:
A expressão Vitória de Pirro tem sua origem nas guerras travadas entre romanos e gregos helenísticos pelo controle de toda a península itálica. Em uma destas guerras, a Guerra Pírrica (aprox. 275 a.C.) o rei heleno Pirro, que governava o Épiro, na costa oeste grega, venceu os romanos na Batalha de Ásculo, que ficava na Magna Grécia, ao leste da península itálica.
Apesar da vitória contra os romanos, as baixas sofridas pelos exércitos helenísticos foram tantas que teriam levado o Rei Pirro a afirmar que outra vitória como aquela seria o seu fim. De fato, Pirro acabou por retornar a Épiro, na Grécia, e os romanos logo depois tomaram toda a península itálica colocando um fim à Magna Grécia.