por paulo eneas
Historicamente, desde quando os termos direita e esquerda passaram a ser usados como régua ou escala de identificação de mentalidades presentes na sociedade e suas expressões politicas, o espectro político da direita sempre foi ocupado por forças políticas e correntes de pensamento associadas a um conjunto claro e inequívoco de valores e princípios, sendo que os principais são:

  • A defesa inequívoca do capitalismo e da economia de mercado.
  • A defesa da propriedade como bem inalienável diante do Estado e de outros indivíduos.
  • Estado mínimo, sem ingerência na vida das famílias, dos indivíduos, e das empresas.
  • A justiça como único árbitro legítimo dos conflitos, que sempre irão existir na sociedade, segundo os princípios da rule of law.
  • A liberdade como valor fundante e inegociável.
  • A soberania nacional como base das relações internacionais.
  • A defesa da vida humana desde sua origem, a concepção, como baliza moral igualmente inegociável.
  • A distinção clara entre assuntos de interesse público (res publicae) e aqueles exclusivos da esfera da vida privada (res privatae).

Obviamente a pequena lista acima não esgota o que se entende, ou se entendia, por direita, mas ela constitui-se o núcleo, a base mínima a partir da qual alguém poderia definir a si mesmo como sendo de direita.

Observe-se ainda que todas as ideologias coletivistas como socialismo e comunismo e suas inúmeras variantes, como certas vertentes radicais do progressismo, partem justamente do ataque contra esses princípios e da negação deles, por meio de plataformas políticas que procuram aboli-los.

Por exemplo, a agenda identitária, uma isca lançada pela esquerda que a direita mordeu com gosto e saboreou e ainda segue saboreando até babar (conforme mostraremos em detalhe em artigo em separado), nada mais é que a negação do último item citado sobre res publicae x res privatae.

Mas o observador atento irá notar que nos últimos anos o discurso e a prática da direita política vem aos poucos colocando de lado esses temas. O próprio leitor pode constatar isso: tente identificar quando e qual foi o último empenho e esforço da direita política para  implementar políticas efetivas de redução do tamanho do Estado?

Quando foi que a direita política e seus representantes se mobilizaram de fato para modificar nosso ordenamento jurídico para dele remover os dispositivos que tornam vulnerável e fragilizam o direito de propriedade? E dispositivos assim estão presentes tanto no texto constitucional quanto na legislação infraconstitucional.

Os exemplos poderiam prosseguir, mas basta uma observação cuidadosa e desapaixonada do nosso ambiente político na direita para constatar que esta direita que existe hoje vem se afastando ou dando importância puramente retórica e eleitoral aos princípios que definem a direita.

E desta forma a direita existente hoje no Brasil vem caindo numa vacuidade moral e de princípios, como se sua razão de existir fosse apenas a de ser anti e ser contra o que a esquerda representa, tornando-se assim apenas uma direita reativa, incapaz de ser propositiva o bastante para apresentar um projeto de Nação robusto para o país.

Ocorre que o vácuo não persiste. E este vácuo moral e de princípios em que a direita se encontra, exemplificado pelo seu anestesiamento moral em relação a práticas de corrupção por exemplo, vem sendo preenchido pela adesão e alinhamento quase completo dessa direita com ideologias como o eurasianismo e regimes autoritários como o da Rússia.

É como se em um período de poucos anos, a direita clássica passasse por uma metamorfose da própria alma, que fez essa direita abandonar ou relegar a um segundo ou terceiro plano aquilo que a define, sua ontologia, para, não apenas no plano político, mas também nas visões de mundo, simplesmente abraçar regimes de ditadura e lideranças políticas populistas que ao longo da História mostraram-se ser exatamente o oposto daquilo que a direita defende. Ou defendia?

Ilustração: reprodução da escultura Melancholy escultor romeno Albert György, erguida às margens do Lago de Genebra, na Suíça.


 

1 comentário

  1. Não é à toa que o grande cientista e escritor Gustavo Corção, em seu magistral livro, O SÉCULO DO NADA, pasmem, de 1973!, ou seja, 52 anos atrás, teve a coragem de desnudar o embuste direita x esquerda.
    Dedica um capítulo inteiro sobre essa dualidade fictícia e desinformativa.
    O verdadeiro contraponto chama-se CONSERVADORISMO, com o rol de ideias apresentadas no artigo acima.
    O que está acontecendo no mundo só corrobora o que o falecido Gustavo Corção expôs com maestria.

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