por paulo eneas
O tarifaço anunciado nesta quarta-feira (02/04) pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, está sendo corretamente chamado de Dia da Ruína, pela revista The Economist. No dia seguinte ao anúncio das medidas, uma onda de incerteza e insegurança afetou toda a economia mundial, principalmente a dos Estado Unidos.

As principais empresas norte-americanas perderam centenas de milhões de dólares em valor de mercado, perdas estas refletidas no comportamento das principais bolsas de valores dos Estado Unidos, que fecharam todas no dia seguinte com quedas expressivas superiores a 3.98% (Dow Jones). Por exemplo, a Nasdaq fechou a quinta-feira (03/04) em queda de 5.97% no valor de suas ações. Bolsas europeias também fecharam em queda acentuada.

Este processo de quedas generalizadas, chamado de aumento da aversão ao risco no jargão dos analistas, veio acompanhado da queda nos preços internacionais do petróleo e do próprio dólar em relação às principais moedas internacionais, conforme medido pelo índice DXY. A queda do dólar foi acompanhada da valorização relativa do Euro.

A queda acentuada nos preços internacionais do petróleo que seguiu-se ao anúncio das tarifas de comércio internacional é um dos mais fortes indicadores de retração da atividade econômica no mundo todo, apontando para o risco concreto de uma recessão em escala internacional provocada pela mudança arbitrária na regras do comércio internacional promovida por Donald Trump.

Uma Completa Arbitrariedade na Definição das Tarifas
Inicialmente acreditava-se que Donald Trump iria anunciar medidas de reciprocidade em relação a tarifas de comércio exterior com os parceiros comerciais dos Estados Unidos. Por exemplo, se um dado país cobrasse x por cento nas importações de produtos americanos, os Estados Unidos cobrariam os mesmos x por cento de tarifa para a entrada de produtos desse país no mercado americano.

Se fosse essa a medida anunciada ela seria justa e não haveria o que se criticar. A propósito, essa foi a promessa feita em fala recente pelo secretário do Tesouro (equivalente a ministro da Fazenda) dos Estados Unidos, Scott Bessent.

Ocorre que não foi isso o anunciado. O que o governo Trump fez foi, em relação a cada país, adotar uma tarifa definida pela metade da ratio do déficit comercial americano com aquele país em relação ao valor das exportações daquele país para os Estados Unidos.

Ou seja, não se trata de reciprocidade tarifária nominal, mas sim uma feitiçaria numérica aleatória, sem qualquer lastro no conhecimento em ciência econômica consolidada, para se aplicar tarifas aleatoriamente como se não houvesse amanha. E caso se prossiga com esta sandice, poderá não haver mesmo um amanhã, aos menos para a economia americana no curto e médio prazo.

Chamou a atenção dos analistas o caso do Vietnam: aquele país foi tarifado em 45% segundo a métrica de feitiçaria adotada. Ocorre que os Vietnam não aplica tarifas desse valor para entrada de produtos americanos no seu mercado.

Retrocesso de Cem Anos no Comércio Internacional
Os analistas também afirmam que o isolacionismo radical dos Estados Unidos sob o regime político de Donald Trump, isolacionismo este que foi antecipado por nós ainda no ano passado durante a campanha eleitoral americana, representa um retorno ao padrão de comércio internacional “travado” que existia entre as décadas de vinte e trinta do século passado.

Esse sistema de comércio internacional travado mantido por um estado permanente de guerra comercial de todos contra todos ensejou o ambiente para o surgimento de movimento ideológicos autoritários como fascismo e nazismo e desaguou na Segunda Guerra Mundial.

Após a guerra e suas mazelas, um longo processo de negociação, que incluiu a formação da União Europeia, por incentivo e estímulo dos Estados Unidos, e entidades multilaterais como a Organização Mundial do Comércio, permitiu o surgimento pactuado do sistema de livre comércio internacional existente hoje e que beneficiou principalmente os Estados Unidos. É este sistema internacional de livre comércio que está sendo agora detonado e destruído por Donald Trump.

Cabe observar ainda que a medida adotada por Donald Trump também repete a fórmula conhecida como Smoot Hawley Act. Tratou-se de uma lei dotada em junho de 1930 pelo governo do então presidente Herbert Hoover e que impôs tarifas elevadíssimas a milhares de itens importados pelos Estados Unidos de seus principais parceiros comerciais.

Os países afetados pela lei reagiram em reciprocidade, impondo tarifas de importação análogas aos Estados Unidos, o que travou o comércio mundial e assim acentuou e prolongou a Grande Depressão Econômica, retratada até mesmo em filmes, que se seguiu ao Big Crash da Bolsa de Nova York de 1929.

Como as Tarifas Afetaram o Brasil
Entre os mortos e feridos pelo tarifaço de Donald Trump, o Brasil sobressaiu-se como um dos poucos sobreviventes: analistas avaliam que a imposição de tarifa de 10% aos produtos brasileiros “não foi tão ruim” ante as tarifas impostas aos demais países.

Ainda assim, foi uma medida hostil ao nosso país. Segundo estudo da FGV Ibre, baseado em dados do Banco Mundial, o Brasil aplicou em média uma tarifa de 4.70% nas importações de produtos americanos ao longo do ano de 2022. Nesse mesmo ano, os produtos brasileiros foram taxados em média em 1.30% para entrar no mercado americano.

Portanto, segundo estes dados e caso esse padrão tenha se mantido, uma tarifa média de 4.70% aplicada ao Brasil seria justa. No entanto, os produtos brasileiros foram taxados em 10% com a decisão de Donald Trump. O Brasil deveria adotar medida de reciprocidade, aplicando tarifa de 10% nas importações de produtos americanos? Analistas divergem a respeito.

O Que Donald Trump Realmente Pretende
Há um questionamento generalizado sobre qual a verdadeira intenção de Donald Trump com seu protecionismo exacerbado, que irá afetar principalmente a economia interna dos Estados Unidos, com reflexos igualmente deletérios para toda a economia mundial.

Uma corrente de analistas avalia que a agenda secreta de Donald Trump seria promover uma recessão profunda na economia norte-americana para desta forma equacionar o problema da crescente dívida pública dos Estados Unidos. Esse hipótese merece ser considerada, pois ela possui lógica interna e uma racionalidade econométrica, que exploraremos em artigo em separado.

No entanto, a meu ver, a agenda verdadeira de Donald Trump e as medidas dela decorrentes, tanto na economia como na geopolítica, não podem ser explicadas por uma racionalidade econômica, ainda que uma racionalidade perversa que preconiza a destruição de valor e de riqueza e a colocação de milhões de americanos na pobreza para resolver o problema da dívida pública.

O que explica Donald Trump e suas ações, e que antecipamos em linhas gerais ainda antes das convenções do Partido Republicano no ano passado, é a compreensão do que realmente representa a direita ocidental hoje.

Essa direita ocidental hoje representa um movimento político-ideológico profundamente hostil a todos os valores fundantes da Civilização Ocidental e que incluem, entre outros, a democracia, o sistema de justiça, sistemas de governo com pesos e contrapesos, economia de mercado, livre comércio internacional e soberania nacional.

É a destruição desse sistema e sua substituição por um modelo de ditadura que constitui-se no núcleo do projeto político, ideológico e civilizacional da atual direita ocidental, e materializado no regime político que vem sendo construído por Donald Trump, que vem governando os Estados Unidos à revelia do Congresso, à revelia das decisões da justiça e à revelia da própria Constituição dos Estados Unidos. Nota: A Rússia, Bielorrússia, Cuba, Coreia do Norte ficaram de fora do tarifaço de Donald Trump.


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1 comentário

  1. Parece que Trump quer provocar uma tragédia. Talvez uma guerra. Não acredito em próximas eleições. Também não acredito que as democracias em todo o mundo sobrevivam nos próximos 10 ou 15 anos. O cenário é terrível. O mundo se aproxima cada vez mais, e rápido, de uma ditadura global. Está vindo aí. E Trump está preparando terreno perfeitamente.

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