por paulo eneas
Em seu discurso na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas nesta terça-feira (21/09), o Presidente Bolsonaro fez menção a dois temas que estão entre os mais caros e prementes no que diz respeito à liberdade e à saúde dos brasileiros no contexto da pandemia do vírus chinês: a vacinação obrigatória via passaporte vacinal e o tratamento precoce da Covid-19. O presidente afirmou:
“Apoiamos a vacinação, contudo o nosso governo tem se posicionado contrário ao passaporte sanitário ou a qualquer obrigação relacionada a vacina. Desde o início da pandemia, apoiamos a autonomia do médico na busca do tratamento precoce, seguindo recomendação do nosso Conselho Federal de Medicina.
Eu mesmo fui um desses que fez tratamento inicial. Respeitamos a relação médico-paciente na decisão da medicação a ser utilizada e no seu uso off-label. Não entendemos porque muitos países, juntamente com grande parte da mídia, se colocaram contra o tratamento inicial. A história e a ciência saberão responsabilizar a todos”.
A diferença entre o discurso e a prática
Ocorre que existe um abismo entre a fala do presidente naquele fórum internacional e a realidade das ações, ou falta delas, de seu governo. A obrigatoriedade da vacinação contra o coronavírus foi determinada em artigo da Lei Federal No 13.979 assinada pelo próprio presidente no início da pandemia.
Esta lei ensejou decisões judiciais posteriores nela baseadas que serviram e estão servindo de retaguarda e respaldo jurídico para a imposição da obrigatoriedade da vacinação, via o instrumento do passaporte vacinal como mecanismo de controle e fiscalização desta obrigatoriedade.
Todas as cidades do país, bem como órgãos públicos e até mesmo empresas privadas, que têm imposto a obrigatoriedade da vacinação contra a covid como pré-condição para o acesso a serviços públicos ou privados, incluindo atendimento de saúde e serviços de educação, ou como pré-condição para a manutenção de empregos, o fazem com base na Lei 13.979.
Há mais de um ano o governo federal e sua base no congresso têm sido cobrados para tomar a iniciativa de modificar ou revogar artigos desta lei. Estas cobranças são simplesmente ignoradas e o presidente nada diz a respeito. Além disso, ministérios e outros órgãos do governo têm atuado no sentido de garantir a imposição e implementação desta obrigatoriedade.
Portanto, o que se tem tão somente é a retórica do presidente posicionando-se contrariamente à vacinação compulsória, enquanto na práticas todas as ações de seu governo foram e continuam sendo adotadas no sentido de assegurar e implementar a obrigatoriedade da vacinação, que constitui-se em si em uma agressão sem precedentes aos direitos fundamentais de cada indivíduo.
Tratamento precoce: governo simplesmente ignora o tema
No que diz respeito ao tratamento precoce, o governo federal, através do Ministério da Saúde, simplesmente ignora o assunto.
Apesar de o presidente ter feito menções no início da pandemia ao uso de medicamentos reposicionados para tratamento da covid, menções estas que na prática constituíram-se apenas em episódios midiáticos sem consequência alguma em termos de política governamental, o governo federal nunca adotou ações concretas que viessem a garantir este tratamento para as pessoas que desejassem.
Em que pese o respaldo proporcionado aos profissionais de saúde pelo Conselho Federal de Medicina, com base na lei da liberdade do ato médico, o Ministério da Saúde nunca nem mesmo dignou-se a elaborar Nota Técnica para fornecer respaldo e retaguarda adicional aos médicos habilitados a tratar pacientes com covid.
O ministério nunca se propôs a elaborar um programa, ainda que de natureza emergencial, para assegurar a todos os brasileiros portadores do coronavírus o direito de ter acesso a tratamento médico e a medicamentos recomendados pelos seus médicos, com base no consentimento informado, para tratar da doença.
A Constituição Federal afirma que saúde é um direito de todos e um dever do Estado. Ainda que não concordemos com esta premissa, ela está presente no texto constitucional e não foi plenamente observada em vista da omissão do Ministério da Saúde no que diz respeito ao tratamento de pessoas com covid. Todas as ações da pasta limitaram-se a proporcionar vacinas.
Os médicos que hoje disponibilizam, via consentimento informado, o tratamento médico a pessoas com covid com base em fármacos reposicionados, sofrem perseguições e ameaças de todo o tipo, inclusive na rede pública de saúde. E tudo isto ocorre diante do completo silêncio e omissão do Ministério da Saúde, que rendeu-se ao lobby da indústria farmacêutica e tornou-se basicamente um Ministério da Vacinação.
Portanto, em que pese a impacto causado pela fala do presidente nas Nações Unidas a respeito destes temas, esta fala em nada corresponde à realidade das ações e omissões de seu governo no que diz respeito à pandemia do vírus chinês.